São Paulo – A pandemia do novo coronavírus está se disseminando pelo interior de Minas Gerais, em diversas cidades que já estão próximas do esgotamento do sistema de saúde. Apenas nos últimos 10 dias, os municípios mineiros com casos confirmados de covid-19 passaram de 487 para 573 – avanço de 57% para 76% da disseminação da doença. As informações são do programa Outra Estação, da rádio da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG Educativa.
Ao todo, a interiorização do coronavírus é uma realidade em mais de 70% dos municípios daquele estado. O boletim epidemiológico da Secretaria estadual de Saúde divulgado nesta sexta-feira (19) contabiliza 26.052 casos confirmados da doença. Pelo menos 600 pessoas já morreram em decorrência da covid-19. Entre elas, 30 vidas foram perdidas nas últimas 24 horas. Outras 242 mortes estão em investigação.
Os dados sobre os óbitos em Minas também revelam outra tendência preocupante. De acordo com um balanço feito pelo jornal O Tempo, a doença já matou mais que o dobro de pessoas no interior mineiro, em relação à região metropolitana de Belo Horizonte. Nos primeiros 100 dias do pandemia, completados na terça (16), 152 mortes na capital e nas cidades do entorno foram confirmadas. Enquanto que nas demais regiões o número de óbitos no mesmo período foi de 337.
A alta em óbitos e em número de casos já provoca 75% de ocupação dos 2.964 leitos de terapia intensiva (UTI) do Sistema Único de Saúde (SUS) de Minas. A situação é ainda mais grave em regiões mais pobres, como o Vale do Jequitinhonha, no norte do estado, onde mais de 90% dos leitos em UTI já estão ocupados. A região tem um dos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) mais baixos do país, de acordo com o IBGE.
O colapso também se repete em outras quatro macrorregiões mineiras, que abrangem quase quatro milhões de habitantes: o Vale do Aço, o Nordeste mineiro, Triângulo Norte e região leste.
Perto do caos
Por trás da interiorização está o “baixo rigor no cumprimento das medidas de distanciamento social”, avalia o professor de Geografia da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) em Diamantina, Douglas Sathler, doutor em Demografia pela UFMG, à rádio da instituição.
Desde o fim de maio que os governos municipais e estadual colocaram em ação planos de retomada das atividades de alguns setores econômicos. O governador Romeu Zema (Novo), alinhado ao discurso bolsonarista, reconheceu nesta semana que a rede de saúde pode entrar em colapso devido ao ritmo de elevação da doença.
Zema declarou que pode vir a adotar medidas mais rígidas de isolamento – um aceno de recuo do plano “Minas Consciente”, que estabelece parâmetros para a flexibilização. Em Belo Horizonte, por exemplo, sob a gestão do prefeito Alexandre Kalil (PSD), duas semanas após a reabertura do comércio, a taxa de ocupação de leitos de UTI disparou.
Além disso, a tendência é de maior sobrecarga no sistema de saúde da capital mineira e de cidades maiores, diante da desassistência no interior do estado. “Os sistemas serão, inexoravelmente, sobrecarregados, com risco para todos”, alerta o professor da Faculdade de Medicina da UFMG Geraldo da Cunha Cury, coordenador do grupo Internato em Saúde Coletiva.
Subnotificação ‘além da conta’
Ao programa da rádio da UFMG, Douglas Sathler também chama a atenção para uma realidade ainda mais grave no estado, que é o que menos notifica oficialmente os casos referentes à pandemia no país. Pesquisa da instituição indicou que para cada caso da covid-19 confirmado em Minas, outros 16,5 deixam de ser registrados.
Por essa estimativa, Minas Gerais teria hoje aproximadamente um total de 411 mil pessoas infectadas pelo coronavírus. Epicentro da pandemia, São Paulo acumula quase 212 mil casos confirmados da doença.
Os especialistas também contestam o baixo número de testes promovidos. Mesmo sendo o segundo estado em números de habitantes, até maio. Minas tinha realizado 78 testes para cada 100 mil residentes. Com isso, ficou à frente somente do Rio de Janeiro, que fez 81 testes a cada 100 mil habitantes